Difícil na cultura ocidental encontrar alguém que nunca tenha ouvido falar no Sherlock Holmes. Sem sombra de dúvida se trata do maior detetive fictício de todos os tempos, e para um personagem criado no século XIX, o que para nós já soa como algo bastante antigo, é de se impressionar com tamanha força. Quem deu vida ao detetive britânico foi o médico e escritor Sir Arthur Conan Doyle, em seus romances e contos publicados originalmente em jornais e, posteriormente, compilados em livros com tiragens imensas.
Holmes veio a se destacar no mundo da literatura britânica para logo em seguida cair no gosto de todos os leitores do planeta. Conan Doyle fez uso das novidades de seu tempo: o método científico e a lógica indutiva, que ganhavam destaque no meio intelectual/filosófico, proporcionando ao excêntrico investigador um ar de genialidade e de habilidades mentais fora do comum. Não haveria um caso complexo e aparentemente impossível que ele não pudesse solucionar, com a ajuda do seu fiel companheiro Dr. Watson, que assume o papel do narrador nos livros.
Já foram produzidos dezenas de filmes, seriados, adaptações para outras mídias em geral, mas o público ainda faz questão de ter contato com as obras que deram origem a todo esse fenômeno que é Sherlock Holmes. No entanto, saber por onde começar e qual ordem seguir é meio caminho andando, então me proporei a indicar este caminho. Não que ele seja o único possível, mas me foi bastante útil no auge dos meus quatorze anos, quando devorei quase todos os livros do morador da rua Baker, número 221B.
Um Estudo em Vermelho
Se é pra começar bem, tem que ser com esse daqui. Publicado originalmente em 1887, Um estudo em vermelho chegou a ser considerado uma espécie de “livro do Gênesis” para os casos de Sherlock Holmes, pois marca não só a primeira aparição pública do detetive mais popular da literatura universal como o primeiro encontro entre Holmes e Watson. O médico, ao voltar de uma guerra, procura um bom lugar para morar em Londres e descobre que um senhorio está disposto a alugar um quarto na rua Baker. É o próprio Holmes que se apresenta para o novo inquilino, mas de forma bastante esquiva sem revelar o que faz para pagar as conas. É tentando descobrir qual é a ocupação do misterioso Holmes que Watson acaba se envolvendo nas investigações de um bizarro crime de vingança, com reviravoltas impressionantes.
O Signo dos Quatro
Depois do verdadeiro fenômeno que foi Um Estudo em Vermelho, Conan Doyle foi bastante pressionado para lançar uma continuação com o icônico personagem. Publicado em 1890, O signo dos quatro traz Sherlock Holmes irresistivelmente atraído pelas agruras de sua cliente Mary Morstan, uma bela mulher atormentada por um passado nebuloso. O detetive mais famoso do mundo e seu fiel amigo Dr. Watson veem-se às voltas com uma aventura repleta de elementos dramáticos, colocando em questão algumas certezas até para o próprio Holmes. Vemos também o Mestre afundado em drogas (a cocaína era permitida na época) e a dissolução da moradia que dividia com Watson em Baker Street. A trama se assemelha ao primeiro livro, trazendo uma experiência familiar para o leitor, mas provoca e estica em alguns outros pontos não trabalhos anteriormente.
As Aventuras de Sherlock Holmes
Depois de ler os dois primeiros romances, me parece mais do que interessante se enveredar pelos contos do detetive. Para os desavisados, Conan Doyle escrevia muitas histórias curtas para jornais e revistas britânicos, onde narrava as aventuras do seu protagonista nos mais diversos lugares. Em As Aventuras de Sherlock Holmes, temos uma compilação desses primeiros doze contos de Holmes, publicados originalmente entre julho de 1891 e junho de 1892 na revista britânica Strand Magazine. Entre esses contos estão as histórias mais conhecidas do mestre de Baker Street, como “A Liga dos Cabeças Vermelhas”, “Escândalo na Boêmia” e “A banda malhada”. A comodidade é vantajosa para os que não tem tanto tempo de acompanhar um enredo mais longo, possibilitando ao final de cada caso uma pausa para numa outra oportunidade seguir os passos das outras páginas.
As Memórias de Sherlock Holmes
Dando continuidade aos contos, As Memórias de Sherlock Holmes reúne onze histórias publicadas originalmente na revista Strand, entre dezembro de 1892 e dezembro de 1893. Entre estes contos, narrados pelo Dr. Watson – velho amigo e o mias fiel observador do gênio dedutivo de Holmes –, estão algumas daquelas que são consideradas por fãs e especialistas as melhores histórias do detetive. É o caso de “Silver Blaze”, em que Holmes e Watson investigam, às vésperas de um grande torneio do turfe inglês, o sumiço do cavalo favorito da prova, e “O ritual Musgrave”, em que os dois são chamados para desvendar o paradeiro e o estranho comportamento do mordomo e da governanta de uma tradicional família. É aqui que teremos um panorama da carreira do detetive desde o início do seu ofício. É apresentado ao leitor um de seus primeiros casos, “O Gloria Scott”, desvendado quando Sherlock era ainda um jovem estudante, antes de se decidir a seguir a profissão de investigador; em “O intérprete grego” ficamos conhecendo Mycroft, o irmão de Sherlock, dono de uma mente dedutiva privilegiadíssima, à altura do irmão mais novo, e em “O problema final” temos Holmes no ápice da sua carreira, arriscando tudo e lutando ferozmente contra um inimigo à sua altura: o professor Moriarty, o Napoleão do crime organizado
O Cão dos Baskerville
Hora de retornar aos romances canônicos, e com grande estilo. A morte do rico proprietário Charles Baskerville está relacionada a um mistério que envolve uma antiga maldição de família, uma grande herança e um enorme cão sobrenatural. Holmes e seu assistente Watson são chamados para investigar o que está causando tudo isso. Conhecido como um dos primeiros best-sellers do século XX e considerado por muitos como o melhor romance policial já escrito, O cão dos Baskerville arrebata o leitor com seu enredo de horror gótico, um clima de ameaça constante, estranhas pistas e inúmeros suspeitos. Baseado em lendas locais sobre cães negros e fantasmas vingativos, esse é mais um caso brilhante do imbatível detetive de Baker Street.
O Vale do Medo
Um crime aparentemente perfeito, um brilhante detetive e uma trama espetacular que mistura elementos de pulp fiction ao clássico romance de enigma. Em O Vale do Medo (1915), Sherlock Holmes e seu leal Watson descobrem que um certo John Douglas, proprietário e morador do Solar Birlstone, corre perigo de vida iminente. No entanto, pouco depois, ficam sabendo que o assassinato fora consumado na noite anterior, em circunstâncias extraordinárias. Desvendar esse mistério acabará transportando Holmes e Watson para décadas antes, quando, do outro lado do Atlântico, na Pensilvânia dos anos 1880, violência, corrupção, uma organização secreta e operários de uma mina de carvão misturavam-se perigosamente… O crime parece insolúvel. E seria, se o detetive da história não fosse Sherlock Holmes. Lançado no início da Primeira Guerra, esse romance é a última narrativa longa sobre Holmes e Watson.
E depois…
Por fim, existem contos posteriores que retornam com o personagem, como O Último Adeus de Sherlock Holmes e Os Arquivos de Sherlock Holmes, que também foram publicados em jornais e revistas, mas para mim o seu último romance proporciona um bom encerramento. Se ainda bater uma saudade, vale a pena conferir os contos posteriores a nível de curiosidade, e quem sabe consumir também as adaptações e livros não canônicos produzidos depois que toda a obra de Arthur Conan Doyle tornou-se domínio público. A exemplo destes, temos o livro O Xangô de Baker Street (escrito por Jô Soares), e o seriado Sherlock, produzido pela BBC e que traz o detetive e seu amigo Watson para o século XXI, numa nova roupagem.